O coronavírus e a crise capitalista

O coronavírus e a crise capitalista

A identificação de causas e efeitos da pandemia Covid-19 somada à crise capitalista, anterior à própria doença, é tarefa fundamental e incontornável para a esquerda. Por suposto, tal identificação só será possível se a conjuntura configurada em tal equação for devidamente analisada a partir de parâmetros marxistas leninistas. Por consequência, a trotskistas e reformistas de todas as correntes em que se multiplicam fica de antemão vedado o acesso a esse conhecimento crítico e, igualmente, a formulação de políticas revolucionárias na linha da revolução proletária.

Em primeiro lugar, é preciso enfatizar que o capitalismo já dera sinais claros de que mergulhara em grave crise cíclica de reprodutibilidade antes mesmo do advento da pandemia. Na realidade, o socorro prestado pelos governos de praticamente todos os países capitalistas do mundo ao segmento financeiro na crise de 2008 quase que esgotara os recursos disponíveis nos cofres públicos. Daí, todo o conjunto de eventos políticos, sociais e econômicos verificados na segunda década deste século: aprofundamento da pobreza, crise geral de endividamento na área do consumo, queda de investimentos, xenofobia, fortalecimento da extrema direita, Brexit, guerra comercial dos EUA contra a China – além de todo um rosário de eventos conjunturais significativos nas diferentes formações sociais do globo. As reservas internacionais em moeda forte despencaram irreversivelmente em todos os países.

A Covid-19, que incide verticalmente em tal cenário, tem características epidemiológicas sem precedentes, entre as quais a mais aguda é uma inédita velocidade de contaminação do novo coronavírus, o que faz supor uma letalidade praticamente idêntica à peste negra, pandemia que grassou na Europa no século XIV e que deu praticamente o golpe de misericórdia no feudalismo, este já em processo de decadência com o avanço do capitalismo comercial. Em um mês, já são mais de 16 mil mortes na Itália e na Espanha, um morto a cada quatro minutos na França, há cinco dias. As cifras referentes a contaminados passam de 350 mil pessoas nos Estados Unidos, com cerca de 125 mil na Itália e Espanha. O Brasil conta cerca de 12 mil contaminados, com aproximadamente 553 mortos. Os dados mudam a cada minuto, daí a falta de precisão e atualização dos números. Inclusive, no último domingo (05/4) publicaram-se notícias de que tanto o número de mortos quanto o de contaminados vêm apresentando tendência de queda na Itália e na Espanha.

Vamos deixar absolutamente claro que as medidas tomadas pelos governos burgueses no combate à pandemia nada, ABSOLUTAMENTE NADA, têm que ver com a mais mínima preocupação com a preservação de vidas, nada que ver com a mais mínima consideração com a sorte de gente, de pessoas, de seres humanos. Será desnecessário descrever aqui todo um quadro histórico de genocídios e crueldades inimagináveis perpetrados pelo capitalismo em sua origem, em sua formação, em sua manutenção. Os massacres de indígenas brasileiros e norte-americanos certamente não foram atos de amor ao próximo. Assim como a escravidão negra pelo mundo afora. Foi o tráfico negreiro que alimentou a expansão do império inglês nos séculos XVII, XVIII e XIX. Foram as bombas atômicas de Truman que consolidaram o império estadunidense no século XX. Ditaduras burguesas assassinas pelos quatro cantos do mundo, fascismo, nazismo, guerra do Vietnam, invasão da Líbia.

Então, por que o capitalismo vem tomando medidas fortes de contenção da epidemia? Por que o degenerado Donald Trump destinou US$ 2 trilhões (isso mesmo, 10% do PIB do país!) para socorrer seu sistema bancário e aplicar no combate direto à doença? Trump, todos sabemos, é uma excrescência. Assim como o torturador Bolsonaro e seu comparsa Paulo Guedes, velho explorador da miséria do proletariado. Todos eles fiéis serviçais do sistema. Macron, Merkel, Boris Johnson. Todos eles. Há dois dias Guedes declarou que o governo abandonou de vez a meta do equilíbrio fiscal. Parêntesis: o que farão agora os distintos comentaristas do sistema Globo? É preciso dizer o nome deles: Miriam Leitão, Carlos Alberto Sardenberg, Heraldo Pereira, Ariel Palacios, João Borges et caterva – estes, ou suas tristes memórias, um dia terão que prestar contas à história.

Que se anote: o capitalismo aplica e aplicará todos, absolutamente todos, seus recursos disponíveis e indisponíveis para pôr fim à pandemia. O que está em jogo não são “apenas” vidas humanas, mas a vida do capitalismo. Esta é a questão-chave.

A se manterem os atuais (ou até ontem?) níveis de expansão da doença, o capitalismo perderia sua capacidade de reprodução cotidiana, tanto no consumo como na produção de mercadorias, o que faria cair por terra toda a arquitetura financeira do sistema. A soma da fragilidade do sistema herdada da crise mal curada de 2008 com a virulência da Covid desempenharia hoje papel semelhante ao da peste negra na Europa no século XIV, que matou a metade da população do continente. Mas, como registrou Marx, nenhum sistema se deixou cair sem luta, nenhuma classe entrega passivamente seu poder. A pergunta, então, é se o capitalismo possui recursos suficientes para banir a Covid-19. Resposta: possui – e de sobra. Todo um sistema universitário no mundo já se empenha dia e noite para descobrir vacina e remédios de combate ao vírus e à doença. A indústria farmacêutica corre desesperada em busca dos lucros que a oportunidade lhe pode oferecer. Claro que até a total extinção da pandemia muitas vidas serão perdidas, vidas proletárias. Mas isso não conta para os ladrões de mais-valia. O capitalismo não acabará.

Por si, espontaneamente e sem resistir, o capitalismo só cairia nas cabeças infantis de trotskistas e reformistas (gramscianos incluídos) espalhados pelo mundo. Bem, deixemos para estes falsos marxistas toda essa conversa fiada de apocalipse, para eles e para evangélicos em busca de ganhos fraudulentos.

Cenário

Vista a questão nestes termos, o cenário que se desenha no mundo capitalista pós-crise é a adoção de uma nova estratégia de acumulação capitalista baseada em uma espécie de neokeinesianismo, dada a necessidade de recomposição de mercados de consumo irreversivelmente estraçalhados pela crise cíclica somada à crise pandêmica. Foi o que, aliás, afirmou literalmente Paulo Guedes, como dissemos acima. É o que estão dizendo Macron, Merkel, Trump e demais “capos” do capitalismo. Outra mudança decisiva que se pode prever no cenário geopolítico mundial é a emergência da China como a nova potência hegemônica. Se antes da crise tal fenômeno já era percebido como inarredável, agora nos parece não haver o que discutir quanto à questão. Pode-se prever, então, um mundo estruturado em três blocos: China/Rússia, Estados Unidos/Japão e Europa. Permanecendo Ásia, África e América Latina como áreas em disputa.

É no interior da conjuntura de largo prazo que se abrirá no pós-crise que temos que pensar a questão da Venezuela. A partir de então, mais que nunca os Estados Unidos precisarão do petróleo venezuelano, do ouro venezuelano, dos metais nobres venezuelanos. E principalmente precisarão apagar a chama revolucionária venezuelana que ilumina as esperanças dos combatentes em todo o continente. Uma invasão militar imperialista em busca de algo como uma recolonização do país é algo que surge no novo horizonte. Sua concretização (como e quando), contudo, vai depender de fatores conjunturais não previsíveis. Mas é esta a tendência. O MM5 tem defendido faz tempo que a maneira de evitar a concretização desta ameaça é a radicalização do bolivarianismo na linha de uma revolução socialista proletária. Nossa proposta da criação no país de uma Frente de Unificação Revolucionária (FUR) assume dimensão ainda mais urgente no cenário que se abre.

No Brasil, fica a cada minuto mais evidente que Bolsonaro perdeu o bonde da história. Em primeiro e decisivo lugar, a estratégia de aprofundamento do neoliberalismo foi por água abaixo com a crise. Em segundo, ele deixou passar a oportunidade de emergir como líder no quadro do desastre, mantendo sua estratégia da negação da pandemia quando até seu chefe Trump já se rendera à realidade. A consigna, pois, ‘Fora Bolsonaro’, que já não tinha razão de ser, perde toda verossimilhança, pois Bolsonaro já está fora. O cavalo passou encilhado e ele não viu. João Dória, governador de São Paulo, outro fascista degenerado, viu e montou. O governador do Estado do Rio, Wilson Witzel (outro fascista – como há fascistas por aqui!…), se pendurou na garupa.

Que fazer? À esquerda revolucionária, aos marxistas leninistas, cabe de imediato uma forte atuação na linha da ampliação dos direitos do proletariado no campo da saúde pública, do emprego, dos salários, do saneamento e da moradia – principalmente. Cabe igualmente um combate sem trégua nem quartel à ideologia reformista de conciliação de classes – há gente na esquerda até defendendo o escroque do Mandetta! – e ao catastrofismo trotskista. A tarefa central permanece: acumular forças na linha da construção, na luta, do partido revolucionário do proletariado brasileiro.

VENCEREMOS!

 

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