Fora Bolsonaro?

Fora Bolsonaro?

Com o contínuo agravamento da crise institucional e o progressivo desgaste do governo Bolsonaro, ganha cada vez mais corpo a palavra-de-ordem Fora Bolsonaro, proposta pela esquerda socialdemocrata e praticamente já adotada pelos setores liberais do país. O que significa tal proposta, nos termos vagos em que é apresentada? Que ideologia política classista a mesma expressa? Quais suas consequências? Responder a estas perguntas é o objetivo fundamental deste artigo.

Nas duas últimas semanas a cena política nacional vem assistindo a um aprofundamento do desgaste do governo. O já denominado Escândalo  Covaxin, exibindo forte indícios e provas do envolvimento do Palácio do Planalto em uma megaoperação fraudulenta de compra hiperfaturada desta vacina indiana, traz à luz do dia aquilo que todas as pessoas não privadas do sentido de uma visão política elementar já sabiam: Bolsonaro e sua equipe não passam mesmo de mais uma das muitas quadrilhas que dominam a vida sociopolítica do país, só que sediada em local privilegiado, o Planalto. Some-se a tal operação a demissão do agora ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, flagrado no gerenciamento de uma operação de contrabando de milhares de toneladas de madeira – madeira extraída de forma clandestina e ilegal, acrescente-se.

O Supremo Tribunal Federal (STF), por sua vez, estica ainda mais a corda contra o bolsonarismo: mandou retornar à cadeia o deputado estadual (RJ) miliciano Daniel Silveira, que ameaçara publicamente integrantes da Suprema Corte e julgou ilegal todos os procedimentos processuais e iniciativas (sentenças e despachos, inclusive, do ex-juiz e ex-ministro de Bolsonaro Sérgio Moro) em todas as ações ajuizadas contra Lula em Curitiba, capacitando assim, de vez, o ex-presidente a voltar a concorrer à Presidência da República.

Ao mesmo tempo, as vítimas fatais da Covid alcançaram a marca assustadora de 500 mil mortos.

Some-se a tudo isso os mais recentes resultados das pesquisas de opinião pública revelando uma queda livre do capitão na avaliação dos diferentes segmentos da população. Na simulação do desempenho de prováveis candidaturas ao Planalto em 2022, a última pesquisa dá 26% pra Bolsonaro e 56% pra Lula, que assim venceria já no primeiro turno. As manifestações de rua contra o governo do último dia 19/6, reunindo centenas de milhares de pessoas se somadas todas a 400 cidades do país em que ocorreram, exibiram, mais que o próprio número de manifestantes, uma tendência de fortalecimento do movimento. E Bolsonaro continua atirando em seus próprios pés, disparando atabalhoadamente asneiras e as mais primárias impropriedades contra adversários. Na sexta-feira 25/6, vomitou grosserias escatológicas contra a imprensa, a mesma imprensa que praticamente o elegeu em 2018.

É este o pano de fundo para o crescimento da consigna Fora Bolsonaro, que ganha corpo a cada dia. Qual seu significado político?

Já no início do século passado, Lênin afirmava que qualquer proposta de derrubada de um governo teria que vir acompanhada da explicitação do governo que substituiria aquele a ser derrubado. Sem que isso fosse feito, as propostas estariam escancaradas à indefinição, ao oportunismo. Como se sabe, os governos e os estados representam classes sociais. No caso, o governo Bolsonaro representa os grandes capitalistas (dos setores financeiro, industrial e o agrário) e a pequena burguesia consumista. Então, que classe social representaria um novo governo com a derrubada de Bolsonaro? Os propositores e defensores da proposta não dizem, não querem dizer. O máximo a que chegam é pedir um “governo popular”. Ora, Jair Bolsonaro foi eleito pelo povo.

Vamos à história, à história recente do país. Aos primeiros sinais do esgotamento da ditadura 1964-85, os mesmos portadores da ideologia política que hoje lançam o grito genérico do Fora Bolsonaro bradavam por ruas e praças um forte Fora Figueiredo! E a partir da daí veio uma repetição farsesca, em série, dos “foras” não classistas. Seus autores fizeram, e fazem, questão de fazer de conta que não existem trabalhadores no país, de que a classe dos trabalhadores, o proletariado, não pode e não deve aspirar a um governo e a um estado próprios. Enfim, para o reformismo dominante na esquerda brasileira, burguesia e proletariado não são classes historicamente inimigas, no máximo adversárias que poderiam resolver suas divergências no campo do diálogo. Haja desfaçatez.

Recordemos a série: Fora Sarney, Fora Fernando Henrique, Fora Collor, Fora Itamar, Fora Temer! Na suposição de que ainda resta um pouco que seja de integridade e consequência a esta esquerda reformista (trotskistas incluídos), pede-se que a mesma exiba os resultados dos “foras”, de todos eles e de cada um deles. Nós, do MM5, temos a resposta: não sobrou nada de interesse do proletariado, dos trabalhadores, dos de baixo. Só frustração. E, mais importante, sobrou a legitimação do estado burguês, pois é disso que se trata: as campanhas dos “fora” não passaram comprovadamente de jornadas de legitimação do estado burguês, deste estado que oprime, explora e mata os trabalhadores. Ninguém de bom senso poderá negar este balanço geral.

A questão central é que a proposta “Fora Bolsonaro”, nestes termos genéricos em que é formulada e levada adiante, não aponta, como dissemos, para a necessidade de varrer a classe burguesa do governo e do estado como única possibilidade de libertação do proletariado da miséria e da opressão e exploração pelos patrões, pelo tráfico de drogas, pelas milícias, pelo evangelismo financeiro. Esta é, pois, uma questão central, não secundária, ‘de palavras’, como alegam os espertos reformistas e seus aliados trotskistas. Ainda Lênin: não podemos ser irresponsáveis com as palavras. Portanto…

Portanto, a palavra de ordem proposta pelo MM5 é “Fora Bolsonaro – Por um governo de trabalhadores, só de trabalhadores”.

O MM5 não se omite. Não adota uma postura absenteísta diante de um momento tão agudo das lutas de classes no país. A luta contra Bolsonaro fragiliza, sem dúvida, o poder burguês, sendo imperativo que todos os segmentos de esquerda se pronunciem sobre tal momento, atuem sobre o mesmo. Estamos plenamente conscientes de que atualmente, na presente conjuntura, nossa palavra de ordem não pode se viabilizar enquanto uma consigna de ação, sabemos que não é possível instalar um governo de trabalhadores, só de trabalhadores no país, agora. É neste sentido que a consideramos uma palavra de ordem de propaganda, na linha de acumulação de forças revolucionárias. Sim, como marxistas leninistas não podemos, em momento algum, perder de vista nosso marco estratégico de conquista revolucionária do poder pelo proletariado. Não escondemos nossos objetivos. Não queremos acumulação de forças politicamente burguesas e pequeno-burguesas, que é no que resulta todos esses “foras” genéricos tão a gosto da esquerda brasileira e mesmo hegemonicamente mundial.

Não temos condições subjetivas hoje de lançar um chamamento à formação imediata de um governo de trabalhadores, repetimos. Mas podemos e devemos acumular forças para o assalto ao estado e ao poder da burguesia. E que fique mais uma vez claro: usar a falta de condições de tomar o poder para alinhar-se sorrateira e oportunisticamente a jornadas de fortalecimento do estado, da ideologia política e do poder burguês não passa de abjeto oportunismo. Não podemos apequenar nosso sonho.

Venceremos!

Share